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PRÁTICAS LEITORAS

O ato da leitura é um fenômeno completo: uma ausência em presença, como quem só percebe a quantidade de roupas e adornos que carrega quando se despe. É o investimento simultâneo de energias e preconceitos, histórias e expectativas, sujeitos e predicados, ainda que o leitor não o admita ou, mesmo, resista com parcialidades, pragmáticas, afetividades e distrações.


Cada um de nós traz para o momento singular de criação de sentidos seu próprio corpo, sua consciência da situação, um inconsciente insubmisso à circunstância, uma sensibilidade
excessiva ao instante e todo seu repertório de leituras. Tudo isso é mobilizado de forma irresistível,como que dragado pelo vórtice de uma ampulheta que comprime e liberta pelo gargalo do Eu (esse nó impreciso). Todo um mundo recente e antigo, de argamassa e poeira, despeja esse ego que cogita em um instante em aberto.


Temos consciência plena disso? Sabemos que convergem para essa mola formidável e invisível aprendizados e veleidades, desejos e princípios, preconceitos e caridades, infâncias e
responsabilidades? Sentimos como que pela cintura o cortejo de teorias ou de práticas para uma dança em que não há periferias ou centros, mas intenções e coreografias; só agentes, sujeitos e atores de um teatro em exercício? (work in progress sem final previsível)?. 


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Leitores universitários:

quem são, onde vivem, o que leem?...

O Espírito Transformador

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análise do texto de Ferreira Gullar sobre Augusto dos Anjos

A ausência de outras iniciativas como a de Augusto explicar-se-ia pela condição de cultura dependente imposta à nossa pátria. À província é permitido
adaptar e miscigenar culturas estrangeiras, mas, enquanto não lhe for possível questioná-las (mais que adaptá-las), estas não lhe pertencem e nem são capazes de atender ou representar o povo. O mérito de Machado de Assis, por exemplo, consistiria no fato de ter sido capaz de fazer crítica num meio cultural que, além de “emprestado”, não possuía história crítica. Foi capaz de uma superação crítica.


AA teria efetuado uma explosão crítica e não uma superação paulatina e racional do modelo cultural, e por isso F.G. faz questão de frisar a não-intencionalidade de AA em fazer poesia moderna, ainda assim rompendo com a estética vigente. Foi
motivado por uma conjunção de fatores de origens variadas, e não através de uma atividade contínua e consciente.

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Ferreira Gullar faz, também, questão de frisar que não é a forma que muda, mas a idéia - uma nova maneira de se ver o mundo - e, com roupagem poética, fazer-se nova poesia. Augusto estaria, portanto, a descrever o cotidiano (temática
moderna), através de uma linguagem concreta (estética moderna) - próxima ao objeto, e não vinculada ao estilo normatizado.

Escute: duração, ciclo e corte.

Prefácio do Livro de Mônica Mello

O Tempo é a única riqueza do homem.

 

Repete-se, por (in)diferenciação; acumula-se, por estafa; aprisiona-se, por estagnação. Assim é que, nas fábulas e fábricas da existência humana, quem por força pode nunca repete o mesmo prazer; quem por árduo labor conquista seu tempo, já é tarde; e, já, quem só aperfeiçoa incessantemente seu engenho e registro consegue apenas isso: arte. Qualquer que seja o artifício, sutileza ou força de que se disponha em poder, fazer ou poesia, o próprio artifício acaba por revelar-se o ouróboros de seu arrogante, hercúleo ou sofístico prestidigitador.

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Uma ampulheta só tem valor quando escorre – e o lado que esvai e o que se ocupa, ambos se regozijam somente enquanto o movimento, que, a eles alheio, não se esgota.

Para degustar polvilhados outonos

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Prefácio do Livro de Sérgio Bruni

O Homem que tudo leu é o resultado do Doutorado, inspirado no pensador, jurista e filósofo Tobias Barreto. É um opulento volume ficcional/ensaístico de fácil e surpreendente leitura. Em suas quase setecentas páginas são delineadas, com pincel subjetivo e preciso, personagens leitoras tão singulares quanto Barbosa (aprendiz de acadêmico e... “quadradíssimo”) e Tobias Barreto de Menezes — figura histórica que já foi mote nos idos novecentistas, agora resgatado como escritor e gênio de sensibilidade intelectual e atualíssimo dado seu viés crítico ácido simultaneamente poético e objetivo. Tobias Barretto, mais do que muito lido (ou esclarecido), é o homem que não transige e “não negocia”.

A FÉRTIL DIALÓGICA DOS

"POETAS DA RIBALTA"
REGISTRO E CRÍTICA:

Rio De Janeiro, 1996 - 2006

De meados da década de 1990 a inícios de 2000, era possível sair de um encontro poético-performático dadaísta, em uma terça-feira à tardinha, a tempo de intervir criativamente em roda que iniciava suas leituras de Cabral — o clima do Rio era mais que propício às velas da navegação poética. E, se o vento das divulgações informais exatas ajudasse, saberíamos descobrir — a poucos pés de quadras dali — uma homenagem a Quintana, com o auxílio luxuoso de composições exclusivas para o poeta e para aquele evento: circunstância e contexto irrepetíveis como acontecimento, para poucas e seletas testemunhas. 

O singular desses trajetos planetariamente debuxados (além do traço caracteristicamente amador do deslumbramento) era o aproveitamento de tudo, ou quase tudo, como uma paródia a Lavoisier aplicada ao efeito estético, à criação cênica e à interseção entre os modos de representação artística. Era de ver um Versos Íntimos na prosódia de uma guitarra Heavy Metal gerar espontaneamente, no demorar de um ocaso, um Navio Negreiro, em blecaute, ao tinir estridente de vergalhões colhidos na obra da esquina; das leituras em Mircea Eliade ou em Bulfinch , surpreender calidoscópios de Bacos manietados com barbantes pela platéia atônita (sempre apolínea); ou, de um Nijinski, contado em estória, fazer surgir um Malasartes murileanamente crucificado em três focos de luz colorida. Da boa nova de um espetáculo em vista, obras e biografias eram desfolhadas como incunábulos, transmutavam-se pesquisas em novos olhares sobre a própria crítica e sobre a história de uma cultura. Noites e dias eram consumidos cultivando-se um espaço-tempo tão próprio para diálogos e trocas (e alquimias) e de tal sorte e tanta arte, peregrinação e gentileza que sabíamos, como ninguém, que ‘leituras geram leituras’ — e que a poesia era a palavra, grafitada e Proibida.

Quem  mais fala dos livros

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